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Alfabetização de pessoas idosas: ganhos cognitivos e desafios de políticas públicas

A alfabetização na velhice representa uma experiência que vai além do simples aprendizado de leitura e escrita. Este processo revela-se como uma oportunidade singular para novos estímulos cognitivos em pessoas idosas, promovendo o acesso ao conhecimento formal e impulsionando benefícios neurocognitivos.


A literatura científica, ancorada em estudos como de Clouston e colaboradores (2020, p. e156) ressalta que a alfabetização está intrinsecamente ligada à um melhor funcionamento cognitivo, estimulando a plasticidade neural e tendo a possibilidade de atuar como um fator preventivo de demências.

Ao aprofundarmos a compreensão sobre os ganhos cognitivos associados a esse tema, é elencado que a leitura e escrita não estão relacionadas só a habilidade em si, mas também a outras funções cognitivas. Assim, Bramão e colaboradores (2007, p. 363) destacaram que “o ato de ler e escrever em uma língua alfabética envolve processos cognitivos relacionados à exploração sistemática do espaço e à integração motora.”

Contudo, a implementação efetiva de políticas públicas para a alfabetização na velhice enfrenta desafios complexos. A realidade sociopolítica adversa na qual muitos foram submetidos, principalmente aqueles envolvidos em atividades laborais desgastantes na agricultura, produção artesanal e atividades domésticas, contribuiu para a ausência de oportunidades educacionais formais ao longo da vida, resultando em uma considerável parcela da população idosa com níveis variados de analfabetismo.

As políticas públicas direcionadas à essa temática tornam-se, portanto, uma necessidade premente. Barros et al., (2021) enfatizam a importância de programas educacionais adaptados às necessidades específicas dessa população, considerando as barreiras cognitivas e socioeconômicas. Dessa forma, pensa-se na alfabetização não apenas como uma ferramenta de aprendizado, mas também como uma estratégia essencial para a promoção da inclusão social e da equidade entre a população idosa.

Neste cenário, a Organização Mundial de Saúde (OMS) destaca a relevância do envelhecimento ativo como um processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança na velhice. A alfabetização emerge como um pilar fundamental desse conceito, permitindo que os idosos desfrutem plenamente de seu potencial físico, social e mental ao longo de suas vidas. As diretrizes da Política Nacional de Saúde da
Pessoa Idosa corroboram essa abordagem, enfatizando a promoção do envelhecimento ativo e saudável, bem como a formação contínua de profissionais de saúde na área (FIOCRUZ, 2016).

A complexidade desse tema é evidenciada quando consideramos a dificuldade enfrentada por esse público, devido ao analfabetismo, na interpretação de informações relacionadas a receitas médicas, embalagens de medicamentos e orientações para exames. A falta de habilidades literárias compromete a adesão ao tratamento e aumenta os riscos associados à má compreensão de informações para a saúde.

Adicionalmente a esse fato, a alfabetização na velhice desempenha um papel importante também na integração digital. A acessibilidade a tecnologias, como as oferecidas em Infocentros, torna-se uma realidade distante para uma parcela considerável de idosos analfabetos. A habilidade de participar plenamente da era digital, compreendendo as complexidades da internet e das redes sociais, é prejudicada pela falta de habilidades literárias. Assim, a promoção da alfabetização na velhice não é apenas uma questão de inclusão educacional, mas também uma estratégia para reduzir a lacuna digital entre as gerações.

A urgência na implementação de políticas públicas inclusivas e adaptadas às necessidades específicas da população idosa é necessária. A alfabetização na velhice é um meio de adquirir conhecimento e solucionar implicações para a saúde física e mental, bem como para a participação ativa na sociedade. Essas políticas representam um compromisso com a equidade educacional e também se alinham aos princípios fundamentais do envelhecimento ativo, promovendo uma sociedade mais justa e inclusiva para todas as idades.

Referências:
CLOUSTON, S. A. P; et al. Education and Cognitive Decline: An Integrative Analysis of Global Longitudinal Studies of Cognitive Aging. The Journals of Gerontology, [S.l.], v. 75, n. 7, p. 151-160, mai./2019.

BRAMÃO, I.; et al. The impact of reading and writing skills on a visuo-motor integration task: A comparison between illiterate and literate subjects. Journal of the International Neuropsychological Society, Cambridge University Press, v.13, n. 2, p. 359–364, mar./2007.

BARROS, A. D. S. X. et al. A Educação no entardecer da vida. Ensaio: Avaliação e Políticas Públicas em Educação, [s. l.], v. 29, n. 113, p. 1115–1135, 2021.
ALFABETIZAÇÃO PARA IDOSOS: FERRAMENTA NA CONSTRUÇÃO DO PROCESSO DE SAÚDE. [S. l.], [s. d.]. Disponível em: https://saudedapessoaidosa.fiocruz.br/alfabetiza%C3%A7%C3%A3o-para-idosos-ferramenta-na-constru%C3%A7%C3%A3o-do-processo-de-sa%C3%BAde. Acesso em: 1 fev. 2024.

 

Autoras:

Maria Antônia Antunes de Souza
Bacharel em Gerontologia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Foi bolsista de iniciação científica PUB do projeto: “Intervenções psicoeducativas para a COVID-19 aliada à estimulação cognitiva no programa USP 60 +”. Atualmente é colaboradora do Grupo de Estudos em Treino Cognitivo da USP (GETCUSP), atuando na área de pesquisa em treino cognitivo de longa duração.

Profa. Dra. Thais Bento Lima-Silva
Gerontóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP). Docente do curso de Bacharelado e do Programa de Mestrado em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo, coordenadora do Grupo de Estudos em Treino Cognitivo da Universidade de São Paulo, parceria científica do Instituto Supera de Educação

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