por Renato Bernhoeft
A sociedade em que vivemos continua muito centrada na busca, individual e coletiva, de modelos focados no sucesso, felicidade, realização, reconhecimento, autoestima, etc.
Desde a infância, até a fase adulta, somos bombardeados por mensagens, orientações, gurus, educadores, modelos, autoajuda, mentores, filosofias, religiões, heróis, personagens, familiares, e outros tantos profissionais que nos tentam conquistar com a oferta de receitas milagrosas. Fórmulas essas que prometem aumentar nossa autoestima através do sucesso e de um modelo de felicidade, como um estado permanente.
Exceções no mercado tem sido o destaque que vem merecendo alguns filósofos, historiadores, sociólogos ou antropólogos, que, com uma visão e abordagem mais crítica, alertam para os riscos desses modelos, aparentemente encantadores, de um mundo fantasioso e artificial. Tanto no nível individual como coletivo.
Interessante registrar que com o surgimento da pandemia, e o uso intenso de recursos de comunicação virtual, esse quadro se ampliou. Especialmente porque houve um crescimento nos índices de depressão, ansiedade, solidão, suicídios e a dificuldade que muitos têm apresentado para lidar com o isolamento.
Este panorama colocou no mercado um aumento impressionante das ofertas de autoajuda eletrônica e com novos encantos.
Poucos são os que falam da importância e formas de lidar com o fracasso. Ou até mesmo a compreensão de que tanto o sucesso, como a felicidade, não são estados permanentes, mas sim buscas constantes. E que os mesmos são caracterizados por muitos altos e baixos, ao longo de todo o nosso processo da busca por algum sentido para nossa existência.
Um registro interessante que a pandemia desnudou, foi a quantidade de pessoas procurando algum espaço de exposição e reconhecimento através do uso de ‘lives’, e outras formas para se tornar uma ‘pessoa pública’. Clara demonstração da dificuldade de conviver com o anonimato.
Mas o que desejo destacar nessa crônica é uma constatação que já havia feito desde a década 80, quando iniciei processos de “Pós-Carreira”, ou seja, preparação de altos e médios executivos para lidar com o a aposentadoria.
Estou me referindo ao ostracismo. Ou seja, a capacidade de lidar o anonimato, depois de um longo período de destaque no mundo corporativo, encontrando um novo projeto de vida que preserve a autoestima, além de novos sentidos para a vida.
E vale registrar que todo esse processo inclui a criação de uma nova ‘identidade’, considerando que uma das perdas mais sentidas é a do ‘sobrenome corporativo’. Principalmente porque, em muitos casos, a pessoa se tornou, apenas um ‘ex’.
A nossa sociedade está repleta de exemplos de ostracismo mal resolvido. Artistas, políticos, esportistas, executivos, empresários, governantes, líderes comunitários ou mundiais e tantos outros atores, tem demonstrado muita dificuldade de lidar com a falta de brilho, reconhecimento e visibilidade pública.
Da mesma maneira como as pessoas se preparam, ou são educadas para se destacar, necessitam encarar um processo que as prepare para um eventual anonimato e, mais ainda, o ostracismo. E este é um processo que deve ser assumido de forma individual, de preferência enquanto ainda estão com alta visibilidade. Ou já percebendo a queda da sua autoestima.
Este alerta cabe ainda mais numa sociedade de consumo onde a cada dia se fala na importância dos ’15 minutos de exposição pública’.
Não nos faltam instrumentos para este encaminhamento, tais como os fornecidos pela literatura, artes, cinema, teatro e meios de comunicação que estão mais centrados numa visão crítica da nossa sociedade e seus modismos.
Fica aqui registrado apenas um alerta sob a forma de provocação. Cabe a cada um realizar as suas reflexões.
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